DEUS TEM UM CUIDADO ESPECIAL COM AQUELES QUE MAIS SOFREM
Na Liturgia deste Domingo, XXX do Tempo Comum, veremos, na 1ª Leitura (Jr 31,7-9), que o papel do profeta, além de anunciar e denunciar, é também animar, pela Palavra de Deus, as pessoas que estão sem esperança e perderam sua autoestima. Ele diz que Deus tem um cuidado especial com aqueles que mais sofrem.
O Papa Francisco, na Evangelii Gaudium (A Alegria do Evangelho), nos diz que a experiência de Deus toca o nosso coração e gera a alegria que ninguém poderá nos tirar. O Papa adverte: “Há cristãos que parecem ter escolhido viver uma Quaresma sem Páscoa” (EG, 5 e 6). Consequentemente, um evangelizador não deveria ter constantemente uma cara de funeral (EG, 10). O Papa vê, no desânimo e no egoísmo, uma ameaça à fé: “Desenvolve-se a psicologia do túmulo que, pouco a pouco, transforma os cristãos em múmias de museu. Desiludidos com a realidade, com a Igreja ou consigo mesmos, vivem constantemente tentados a apegar-se a uma tristeza melosa, sem esperança, que se apodera do coração como ‘o mais precioso elixir do demónio” (EG, 83). Ele também nos diz para não deixar que nos roubem a alegria e a esperança, pois algumas pessoas: “Nos tempos atuais, não vêm senão prevaricações e ruínas. Mas a nós parece-nos que devemos discordar desses profetas de desgraças, que anunciam acontecimentos sempre infaustos, como se estivesse iminente o fim do mundo... Quem começa sem confiança, perdeu de antemão metade da batalha e enterra os seus talentos” (EG, 84 e 85).
Como o profeta Jeremias, o Papa Francisco anuncia a esperança para os pobres: “Desejo uma Igreja pobre para os pobres”, mas, além de ser pobre para os pobres, a Igrejaquerida porFrancisco é valente na hora de denunciar o atual sistema econômico, injusto desde a raiz (EG, 59). Ele nos faz um apelo: “Somos chamados a descobrir Cristo neles: não só a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas, mas também a ser seus amigos, escutá-los e compreendê-los. Em Gálatas 2,10, o critério chave de autenticidade da Igreja é ‘não se esquecer dos pobres’. Em Mateus 25,34-40 a misericórdia para com os pobres é a chave do Céu” (EG, 195, 197 e 198).
O Papa fala por aqueles que não têm voz, ninguém se preocupa quando ele abraça os doentes e ama os pobres. Mas, quando ele se atreve a refletir sobre as causas morais e estruturais da pobreza, essa é outra questão. Como Dom Hélder Câmara, outro arcebispo profético da?América Latina, observou notoriamente: "Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto por que eles são pobres, chamam-me de comunista". Certas coisas nunca mudam.
Na 2ª Leitura (Hb 5,1-6), a Palavra de Deus nos diz que todos somos cercados de fraquezas, por isso devemos ter compaixão uns pelos outros. Na grande família humana, somos todos por um, um por todos e todos por todos.
No Evangelho (Mc 10,46-52), vemosqueJesus saiu de Jericó em direção à Jerusalém, Bartimeu, “cego e mendigo estava sentado à beira do caminho”, isto é, imobilizado pelas suas carências, sem horizontes, não sabe onde ir, totalmente dependente, está à margem da alegria de viver e conviver com dignidade. Mas, nisto, ouve dizer que Jesus estava passando; então, toma consciência de que Jesus está muito perto de sua vida, de suas dores, carências e sofrimentos. Começa a gritar: “Tem misericórdia de mim”. Como diz uma canção muito edificante para nossa alma: “Tenho esperado esse momento, tenho esperado que viesses a mim”.
O texto diz que “muitos o repreendiam para que calasse”. Aqui, vemos que a sociedade que manda o cego calar é a mesma que trama o fim de Jesus, não tolera quem vê a realidade a partir dos oprimidos, não se importa com os gritos dos que passam fome e que estão carentes de cidadania, não toleram a luta e a pressão popular; querem silenciar os profetas, pois vivem na total ignorância, com ódio no coração e cegueira moral. Querem que a miséria permaneça oculta, que não se mostre, que não perturbe. São os ricos na real miséria, cegos de Deus.
“O grito do cego é o mesmo grito do povo pobre e oprimido que incomoda os bem instalados, os que estão tranquilos na sua vidinha cotidiana e não desejam mais um competidor nos seus espaços e privilégios, os que se sentem ameaçados pela ascensão do pobre. A história de Bartimeu pode se repetir ainda em nossos dias quando nos opomos às conquistas dos marginalizados” (Pe. Nilo Luza, Folheto ‘O Domingo’, n° 50, 2015).
Mas, Bartimeu venceu os impedimentos daqueles que o mandavam calar-se. Jesus ouviu o seu grito, parou e mandou chamá-lo. “Deus ouve o clamor dos oprimidos, vê a miséria, conhece os sofrimentos e desce para ajudá-los”.
Graças a Deus, próximo ao cego, estavam pessoas solidárias (Pastorais Sociais) que, sensíveis à sua condição desumana, o chamam para uma experiência de Deus libertador: “Coragem, levanta-te, Jesus te chama”. Então, ele rompe com a margem, salta para a vida nova, compreende que cegueira é não ter fé, não ver o Projeto de Deus que quer vida em abundância para todos e não só para uma pequena minoria que domina a imprensa de forma maléfica e impede políticas públicas de inclusão dos menos favorecidos. A iniciativa da fé fez com que recobrasse a visão e, iluminado e liberto, seguisse Jesus. Com isso, nos ensina que, por mais dura que seja a realidade, sempre é possível mudá-la para melhor.
Enfim, o princípio da fé é reconhecer a miséria, invocar a misericórdia e, alcançada a graça, seguir Jesus, multiplicando o bem. “Ele passou a vida fazendo o bem”. Neste sentido, Bartimeu é cada um de nós. Jesus nos ajuda a abandonar o ‘manto’ do egoísmo e da submissão às ideologias dominantes para nos tornarmos pessoas solidárias e comprometidas com um mundo melhor, mais humano e mais digno. Mesmo se já velhos, temos que, todos os dias, nascer de novo.
Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus.
Pe. Leomar Antonio Montagna
Presbítero da Arquidiocese de Maringá-PR
Pároco da Paróquia Nossa Senhora das Graças, Sarandi-PR




